Uma Vigilância Elegante

No livro Grandeza do Espiritismo1, o benfeitor José Tatagiba nos ensina que vigilância é a atitude tomada pelo homem que não deseja perder as oportunidades felizes de emancipar-se para a luz. E elenca várias atitudes que apontam para a vigilância.

Por exemplo, podemos admirar o sol ardente, mas não devemos nos expor em demasia a ele, preservando, dessa maneira, nosso corpo. Nos cuidados com a saúde, poderíamos incluir outras vigilantes atitudes como boa alimentação, exercícios físicos, visita periódica aos médicos e bons hábitos de higiene.

O benfeitor aponta como vigilância o cuidado que devem ter aqueles que detêm o privilégio da extroversão e da palavra fácil para que não atinjam os outros com os estilhaços da imoderação.

O cuidado com os dons que temos por conquista ou pela tarefa que desempenhamos, para que não acabem por perturbar mais que auxiliar. Isso vale tanto para a fala quanto para o canto, para as artes, para os esportes e para outros tantos talentos. Devemos sempre pensar na utilidade do dom e não nos usos vazios, que mais perturbarão do que construirão.

Adverte-nos Tatagiba que devemos nos abster da exibição vazia quando percebemos ter melhores condições que os outros à nossa volta, permitindo que os irmãos se expressem antes, dando espaço, sabendo ouvir, sabendo calar, esclarecendo, com singeleza, somente quando houver real necessidade de fazê-lo.

Vamos percebendo na mensagem do benfeitor que ser vigilante é ser elegante, no conceito espiritual desse termo. Ser discreto e cuidadoso, pensar no outro e incomodar o menos possível o próximo.

Lembro da lição de um amigo com quem dividi apartamento e que tinha o cuidado de andar de chinelo em casa. Como estranhei esse costume, já que era um apartamento limpo e poderíamos andar descalços, ele disse que usava o chinelo para não incomodar os vizinhos do apartamento de baixo.

Percebamos como a vigilância sugere esse cuidado nas nossas ações para que não incomodemos e, por outro lado, para que nossas ações sejam sempre construtivas. Cuidado com os ruídos nas festas noturnas e nas comemorações com fogos de artifício. Esses, inclusive, já podem ser silenciosos para que incomodem menos as pessoas de audição sensível e os animais.

O benfeitor prossegue nos ensinando que vigilância tem relação com humildade. Afirma que vigilante é sempre alguém que procura saber o momento de falar ou de calar, de chegar ou de sair, de dizer ou de ouvir, de rogar, servindo sempre.

Torres Pastorino2 afirma que humildade real é o conhecimento de nossa participação na Vida. Tem relação com o saber situar-se.

Para a conquista da humildade, é necessário o autoconhecimento para entendermos o que somos, o que podemos fazer e o que ainda não temos condições de realizar. Conhecendo-nos, poderemos exercer com mais eficiência a vigilância.

Acrescenta José Tatagiba que vale a pena associar a boa vontade à humildade e à vigilância. A boa vontade se refere ao serviço, ao trabalho em favor de todos, desde aqueles que residem conosco e constituem o núcleo familiar em que estamos inseridos até os companheiros dos contatos externos, na rua, no trabalho profissional e na Casa Espírita.

A boa vontade não deve estar presente tão somente nos necessários trabalhos assistenciais que devemos realizar, mas em todos os momentos de nossa vida nos quais, em contato com o próximo, podemos ser úteis e, algumas vezes, muito importantes para o crescimento desses companheiros.

A mensagem termina lembrando que Jesus associou a virtude da oração ao trabalho da vigilância para que nos afastemos das tentações. A oração é essa busca de conexão com a Divindade que nos permitirá compreender melhor os lances do caminho, iluminando as veredas e fazendo com que percebamos, com antecedência, os testes que estão por vir, de forma a permanecermos fortes e vigilantes, crescendo com os aprendizados.

Faz-se importante entender que tentações são oportunidades de crescimento que teremos na nossa vida atual, em regra, relacionadas com o nosso passado reencarnatório, podendo ser provacionais ou expiatórias. Oportunidades de crescimento são verdadeiros testes.

Dessa maneira, compreendemos o conselho de Jesus de vigiar e orar para nos afastarmos das tentações como o conselho de um professor que avisa aos alunos que estudem, prestem atenção na aula e no caminho, e leiam a fim de passar nas provas, evoluir.

Vigiemos, pois, com essa elegância sugerida pelo benfeitor, com humildade, boa vontade, oração e muito cuidado com nosso próximo.

Referências

  1. TEIXEIRA, J. Raul. Grandeza do Espiritismo. Por Diversos Espíritos. Niterói: Fráter, 2019. cap. 18. ↩︎
  2. PASTORINO, Carlos Torres. Sabedoria do Evangelho: 2º volume. Rio de Janeiro: Sabedoria, 1965. cap. Outras curas. ↩︎

Observação

Primeiramente publicado em, abril de 2024, no site “Mundo Espírita” no link: www.mundoespirita.com.br/?materia=uma-vigilancia-elegante

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Marcelo Anátocles Ferreira

Desembargador e Associado da ABRAME.