Jesus e Seu amigo Lázaro

Na questão 625 de O Livro dos Espíritos,1 pergunta Allan Kardec: Qual o tipo mais perfeito que Deus ofereceu ao homem para lhe servir de guia e modelo?

Os benfeitores da Humanidade respondem: Jesus.

A partir daí, surge para nós uma urgente necessidade de entender os ensinamentos que vão nos guiar e a forma como vivia nosso Modelo ideal para que possamos a Ele nos amoldar.

Estudando os Evangelhos e os livros que falam sobre Jesus, encontraremos excelentes lições. Jesus teve amigos. Um deles, Lázaro, irmão de Maria e Marta, que morava na Betânia. Vamos buscar alguns momentos desse relacionamento de Jesus com Seu amigo para que possamos entender melhor nosso Modelo e Suas lições.

Jesus frequentava a casa de Lázaro, Maria e Marta e tinham todos certa intimidade, comum entre amigos. Lázaro ficou doente e as irmãs mandaram dizer a Jesus que aquele amigo que tanto amava estava doente.

Jesus amava Marta, sua irmã e Lázaro, mas estava distante em Suas atividades de divulgação da Boa Nova. Ficou mais dois dias por lá, indo depois na direção de Betânia para encontrar Seu amigo. Ao chegar, porém, soube que Lázaro havia sido sepultado há quatro dias.

Houve uma certa tristeza das irmãs por causa da demora de Jesus. Ambas cobraram Sua ausência, choraram e comoveram Jesus, que também chorou. Ele, em seguida, foi até o sepulcro, uma gruta cavada na rocha, e pediu que retirassem a pedra que fechava a entrada. Houve uma certa perplexidade com a situação, pelo tempo de sepultamento, mas a pedra foi retirada. Em seguida, Jesus determinou que Lázaro saísse, clamando em voz alta:2 Lázaro vem para fora!

Lázaro sai, ligados os pés e as mãos com faixas e com o rosto envolto em um lenço. Jesus volta a ordenar:3 Desligai-o e deixai-o ir.

Muitas lições envolvem essa amizade e a cena emocionante da relação entre Jesus e Seu amigo. Vamos abordar três das muitas contidas no episódio.

A primeira se refere ao tempo da resposta de Jesus, a demora de Sua vinda em socorro a Lázaro. Jesus estava em Suas atividades de divulgação das verdades eternas quando recebeu a informação com o pedido de retorno, mas tinha toda uma organização em Suas atividades. Consta no Evangelho de João que Jesus afirmou que Esta enfermidade não é para a morte, mas para glória de Deus, para que o Filho de Deus seja glorificado por ela.4

Ele sabia que a hipótese seria de um estado de letargia, reversível com Seu poder, Sua energia e Sua vontade. Assim, prossegue em Suas atividades. Demora mais dois dias e todos demonstram uma certa frustração com Sua chegada, aparentemente tardia.

Nossa ansiedade fica em contraponto com a reação de Jesus. Vamos entender que o tempo de Deus é diferente do nosso tempo.

Problemas, sofrimentos e situações difíceis são lições da Escola Terrena, em que estamos matriculados através da reencarnação. Estamos em um processo de evolução. Se não houver provas, não haverá avanço.

A morte de entes queridos é um grande testemunho, o da distância física de ambos os lados. Mesmo quando temos certeza de que a vida continua depois da morte do corpo físico, sofremos com a saudade. Mas essas duras experiências, somadas a outras positivas, nos fazem crescer. É para isso a nossa reencarnação. Se olharmos para o passado, poderemos perceber o quanto já crescemos, como já sabemos administrar melhor os problemas que antes nos incomodavam tanto. Podemos e devemos pedir em oração o auxílio divino, que virá com certeza, mas devemos saber esperar por ele.

Tudo está programado e tudo está em harmonia, mesmo que em aparente desarmonia e nas situações mais aflitivas. O tempo de Deus é o tempo certo, a resposta sempre virá, mas nem sempre obteremos exatamente o que pedimos, nem no momento pretendido. Com o tempo, vamos aprendendo que a intervenção divina sempre está presente e que tudo acontece para o nosso crescimento. Entendemos que somos regidos por Leis de Deus que nos impulsionam para o crescimento. Assim, prossigamos orando, confiando e aguardando, pois, com certeza, no tempo certo, as respostas aos nossos pedidos surgirão.

A segunda lição é referente ao momento em que Jesus, diante do sepulcro, manda que retirem a pedra da entrada da gruta. Vinicius, inspirado escritor espírita, ao abordar essa passagem no livro Nas Pegadas do Mestre,5 faz interessante reflexão: não poderia o próprio Jesus, que iria ressuscitar Lázaro, retirar com Seu poder a pedra da frente do túmulo? Ele conclui que Deus está pronto a fazer por nós aquilo que nós, jogando (contando) com os nossos próprios recursos, não podemos fazer. E, adiante, ainda afirma: O divino age onde o humano é impotente para agir.

Assim, nas nossas orações, nas nossas conversas com a Divindade, tenhamos sempre em mente que devemos realizar a nossa parte na solução dos nossos problemas. Temos que remover a pedra, ou seja, fazer o menos para que Deus faça o mais.

Nas situações difíceis e desafiadoras, vamos pedir a intervenção divina enquanto fazemos nossa parte com os recursos disponíveis. Tanto os recursos terapêuticos espíritas disponíveis e gratuitos como o passe, o atendimento fraterno e a água fluidificada, quanto os recursos terapêuticos gerais como consultas médicas, psicológicas, medicamentos homeopáticos e alopáticos, devidamente receitados, e com o apoio de amigos.

Vamos nos esforçar para retirar os obstáculos exteriores e interiores que nos impedem de ver a luz. Retirada a pedra, realizada a nossa parte, a intervenção divina com certeza virá como consequência.

A última lição a destacar é a ordem de Jesus, que retira Lázaro do sepulcro e da quase morte de tantos dias dizendo:6 Lázaro, sai para fora.

A mensagem do Cristo é de movimento. Jesus pede ação: Ide e pregai. Vigiai e orai. Ame ao próximo como a si mesmo. Ame os inimigos. Sede perfeitos.

Movimentar, caminhar, semear, como o semeador da parábola.

Sair indica um movimento interno. Fazer uma reforma interior, que pode nos exigir enorme esforço. Não foi simples para Lázaro sair dali ao ouvir a ordem, mas ele se esforçou muito e conseguiu. Posteriormente, sofreu muitos preconceitos porque teria vindo do mundo dos mortos. Mas prosseguiu fiel ao bem.

O Cristianismo exige de nós escolhas que se relacionam com ação permanente, com a necessidade de constante esforço por melhora, tanto que Allan Kardec ensina que o verdadeiro espírita é conhecido pela sua transformação moral e pelos esforços que emprega para domar suas inclinações más.7

Concluímos assim essas importantes lições que nos ensinam a buscar o auxílio divino sabendo esperar por ele, compreendendo que as lutas e as dores da vida são para nosso aprendizado.

Devemos tirar do caminho as pedras que nos impedem de ver Deus. Temos que fazer a nossa parte, nossos próprios esforços para possibilitar a intervenção divina, se possível e necessária.

Com vontade resoluta, precisamos sair de dentro de nós mesmos, quebrar barreiras, recomeçar sem amarras com o passado, movimentando-nos na direção de Jesus, esse Mestre tão querido e amigo de todas as horas.

Referências

  1. KARDEC, Allan. O livro dos Espíritos. Brasília: FEB, 2013. pt. 3, cap. I, q. 625. ↩︎
  2. BÍBLIA, N. T. João. Português. O novo testamento. Tradução de João Ferreira de Almeida. Rio de Janeiro: Imprensa Bíblica Brasileira, 1966. cap. 11. ↩︎
  3. VINICIUS. Nas pegadas do Mestre. Rio de Janeiro: FEB, 1944. cap. Tirai a pedra. ↩︎
  4. KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Rio de Janeiro: FEB, 2001. cap. XVII, item 4. ↩︎
  5. VINICIUS. Nas pegadas do Mestre. Rio de Janeiro: FEB, 1944. cap. Tirai a pedra. ↩︎
  6. BÍBLIA, N. T. João. Português. O novo testamento. Tradução de João Ferreira de Almeida. Rio de Janeiro: Imprensa Bíblica Brasileira, 1966. cap. 11. ↩︎
  7. KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Rio de Janeiro: FEB, 2001. cap. XVII, item 4 ↩︎

Nota

Este artigo foi originalmente publicado no site Mundo Espírita. Para acessar o conteúdo original, clique aqui.

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Marcelo Anátocles Ferreira

Desembargador e Associado da ABRAME.