As Árvores do Caminho

O Evangelista Lucas narra, no capítulo 19:1-10, o encontro de Zaqueu com Jesus. Eis uma parte do texto sobre o qual este artigo se debruçará, embora sem analisá-lo por inteiro, restringindo-se a apenas um dos muitos e ricos aspectos dele, razão pela qual a transcrição será parcial.

Jesus entrou em Jericó e estava atravessando a cidade.
Morava ali um homem rico, chamado Zaqueu, que era chefe dos cobradores de impostos. Ele estava tentando ver quem era Jesus, mas não podia, por causa da multidão, pois Zaqueu era muito baixo. Então correu adiante da multidão e subiu numa figueira brava para ver Jesus, que devia passar por ali. Quando Jesus chegou aquele lugar, olhou para cima e disse a Zaqueu:
- Zaqueu, desça depressa, pois hoje preciso ficar na sua casa. [...]

Logo no início, percebemos a referência a uma árvore – sicômoro ou figueira brava – cujo nome científico é Ficus sycomorus, uma espécie de figueira sempre verde, de raízes profundas, tronco robusto e curto, folhas em forma de coração menores do que as da figueira comum, porém de folhagem mais densa e ramos fortes, que produzem figos de qualidade inferior, cultivada no Médio Oriente e em partes da África há milênios, não se confundindo com o sicômoro americano, o Plátano-americano (Platanus occidentalis). Tais figueiras eram ideais para ficarem à beira da estrada.

São várias as referências a figueiras no Evangelho. Especificamente esse texto diz que Jesus estava atravessando a cidade de Jericó, onde morava Zaqueu, um homem de estatura baixa (tomaremos aqui o sentido literal) que, no meio da multidão, gostaria de ver Jesus. O texto realça a disposição de ver, mas ver no sentido profundo de estar com Jesus, e a decisão de segui-lo.

Zaqueu valeu-se de uma árvore para ver o Cristo. E é justamente relativamente a essa parte do capítulo 19 de Lucas que podemos fazer uma analogia com as várias “árvores frondosas” do nosso caminho existencial, as quais nos permitem entender melhor as palavras do Mestre inesquecível. A grande, robusta, fértil e frondosa árvore é o Evangelho. E essa assertiva está patente nas palavras de Emmanuel no livro Pensamento e Vida, capítulo 4: “Retrata-se Jesus nos livros dos apóstolos que lhe dilataram a obra, e temos no Evangelho um espelho cristalino em que o Mestre se reproduz, por divina reflexão, orientando a conduta humana para a construção do Reino de Deus entre as criaturas”.

No Século XIX, sob a coordenação do Espírito Verdade, dessa árvore nutritiva da Casa do Pai surge um ramo que se destaca, com as flores do conhecimento sobre Deus, Suas criações e criaturas, sobre os planos existenciais e suas interrelações, sobre os profundos ensinamentos contidos nas lições de Jesus. Esse ramo é a Doutrina Espírita, que é Doutrina do Cristo, conforme nos adverte Emmanuel no livro Religião dos Espíritos (cap. 80).

E Emmanuel, com sua doçura e objetividade, expõe outras qualidades da Doutrina Espírita, para depois concluir com uma advertência que deve ser uma diretriz para os espíritas:

[…].
Porque a Doutrina Espírita é, em si, a liberalidade e o entendimento, há quem julgue seja ela obrigada a misturar-se com todas as aventuras marginais e com todos os exotismos, sob pena de fugir aos impositivos da fraternidade que veicula.

Dignifica, assim, a Doutrina que te consola e liberta, vigiando-lhe a pureza e a simplicidade, para que não colabores, sem perceber, nos vícios da ignorância e nos crimes do pensamento.
[…].
Doutrina Espírita quer dizer Doutrina do Cristo. E a Doutrina do Cristo é a doutrina do aperfeiçoamento moral em todos os mundos.
Guarda-a, pois, na existência, como sendo a tua responsabilidade mais alta, porque dia vifé em que serás naturalmente convidado a prestar-lhe contas.

Os cristãos, portanto, devem ser o Evangelho vivo, cientes de que nos “círculos de ação, em que nossa existência atua nas existências alheias, podemos simbolizar as almas que nos partilham a luta como árvores vivas, de cuja produção somos de alguma sorte responsáveis no que tange à prestação de serviço que nos compete ofertar-lhes constantemente”. (Emmanuel in: Perante Jesus, capítulo 19).

A Biologia nos ensina que as raízes têm geotropismo positivo (crescem em direção à terra, solo), e os caules (e obviamente seus ramos) têm fototropismo positivo (crescem em direção à luz). Metaforicamente podemos afirmar, talvez poeticamente, que devemos aprofundar as nossas raízes sentimentais nas “terras” dos valores imperecíveis, e assim teremos “ramos” (ações enobrecedoras) que nos farão caminhar para a luz.

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Telma Mª S. Machado

Diretora de Comunicação e Delegada da ABRAME/SE